domingo, 6 de outubro de 2024

Um trabalho digno de registo.Póvoa do Concelho /Trancoso


PÓVOA DO CONCELHO

De certo modo, fui cortesmente desassossegado na minha pacatez. Gentilmente, propuseram-me um tema, deveras exigente, para falar da minha/nossa terra. É um desafio que vou procurar abordar ___ com limitações, é certo ___  e a todos convido para fazer uma viagem às nossas memórias/conhecimentos e dizer algo sem pretensões nem preconceitos. Condição “sine qua non”(condição indispensável...): jamais falar mal da minha/nossa terra!! Espero não ter que me penitenciar deste atrevimento, mas conto já com a indulgência da frase latina “errare humanum est” (errar é próprio do homem).

Póvoa do Concelho é uma das 29 freguesias (até ver.., visto que a reforma da lei autárquica prevê a extinção e fusão de freguesias) do concelho e comarca de Trancoso, distrito e diocese da Guarda. Dista da sede do concelho cerca de 13 km (EM 102-4), 4 km de V.F. Naves (EM 591), e da Guarda 30 Km, aproximadamente (várias são as opções alternativas). Bem se pode dizer que a freguesia, em termos de ligações com os centros urbanos mais relevantes, se encontra suficientemente servida com boas rodovias. A localidade estende-se com tendência longitudinal N/S, ao longo da estrada VN. de Foz Côa/VF. das Naves, tornando-se notório dois núcleos distintos populacionais. Continua a manter a posição no grupo de freguesias do concelho de razoável densidade populacional.

Acontece porém, que já no séc. XIII fazia parte do julgado de Trancoso. Como lugares, outrora povoados, assinalam-se as Quintas da Folhinha e muitas outras espalhadas entre as margens da Ribeira de Vale de Mouro, a poente e a do Massueime, a nascente. Tem por padroeira Nª. Sª. da Graça ( acrescem 7 igrejas no concelho como padroeira e 70 no país, no séc. XVIII), considerando-a, desde os tempos mais remotos, como uma das devoções mais antigas e arreigadas na aldeia, concelho e país. Eclesiasticamente, o pároco da freguesia estava sob a alçada da abadia de Santa Maria de Guimarães (ou Guimarães de Trancoso), usufruindo dos rendimentos próprios de 26$000 mil réis e pé-de-altar.

Depois do séc. XI não parece ter existido aqui qualquer dominação do mosteiro de Guimarães, mas regista-se, todavia, a presença da Ermida de S. Sebastião e uma capela particular a cargo do pe. Manuel de Figueiredo. Pena é que estas verdadeiras relíquias de arte sacra e património religioso não tenham resistido a decisões (in) felizes dos homens, no que se refere ao seu desaparecimento, ou então vítimas da fúria demolidora dos tempos.

É da mais elementar justiça respeitar a tradição, nas suas devidas proporções, e assim mencionar a devoção (de outrora) das Ladaínhas que aconteciam em Maio, em que o humilde povo elevava ao céu as suas súplicas, através da invocação, ora cantada ora rezada, a todos os santos, em favor das culturas e fertilidade dos campos agrícolas. Consta-se até que aqui acorriam, em preces sentidas, gentes de outros sítios, mormente as de Vale de Mouro.

No que respeita às festividades anuais, merece especial destaque a celebração da festa de S. Sebastião, que o calendário litúrgico reserva, para o efeito, o dia 20 de Janeiro, vindo, recentemente, a ser alterado para o 1º ou 2º fim de semana de Agosto, tendo por objectivo fundamental dar oportunidade aos conterrâneos emigrantes a viver no estrangeiro (constituindo uma comunidade considerável, facilitando-lhe o regresso à sua Terra Natal, em gozo de férias), festejar no convívio dos seus familiares e amigos a devoção tão antiga quão sentida de um dos santos de sua eleição. Em jeito de nota de rodapé, dir-se-á que esta alteração de data da festa,  (teve início em 6, 7 e 8 de Agosto de 1999), atrás aludida, em nada diminuiu, bem pelo contrário, aumentou o fervor religioso, bem como a diversidade de eventos culturais e de entretenimentos.

Pois, assim é ainda, com a característica vincadamente mariana, de realçar a profunda manifestação pública de devoção, que o povo dispensa a Nª Sª de Fátima, concretizada anual e solenemente nas procissões dos dias 12 (à noite) e 13 de Outubro, e que tem perdurado desde o aparecimento do fenómeno religioso das aparições de Nª Sª de Fátima (13 de Maio de 1917) às três criancinhas na Cova da Iria, que a Igreja interiorizou, autorizou e propagou a sua Mensagem.

A par destas manifestações de cariz religioso, acrescem ainda as duas Irmandades, a saber: a das Almas e a do Sagrado Coração de Jesus. Ambas são desprovidas de estatutos. A primeira, centra a sua actividade principal, no período da quaresma, com a organização do Aniversário das Almas, traduzindo-se numa cerimónia religiosa, seguida de missa solene em sufrágio das almas do purgatório em geral, bem como, em particular, pela de todos aqueles que, ao longo do ano, deixaram de pertencer ao reino dos vivos. Sublinha-se que a comunidade paroquial acompanha e participa nesta solenidade com particular devoção. Esta irmandade tem ainda a preocupação de, no decurso do ano, mandar celebrar missas em sufrágio das almas dos falecidos. A segunda, tinha a sua actividade direccionada para a devoção ao Sagrado Coração de Jesus, designadamente para a última sexta-feira de cada mês, privilegiando os seus associados, com as quotas em dia, __ em caso de falecimento __  serem acompanhados, no cortejo fúnebre, da Cruz e lanternas de prata e ainda a Bandeira Nova das Almas. Caso contrário, não usufruíam destas mordomias, restando-lhes apenas a Cruz e lanternas com haste de pau e uma outra Bandeira das Almas (alfaias religiosas considerados de menor qualidade). Porém, a irmandade também mandava celebrar missas em sufrágio dos seus associados. Destas duas irmandades, somente a primeira se mantém, enquanto a segunda, infelizmente, se extinguiu, em 2002, devido à indisponibilidade de mordomos para assumir o cargo e assegurar a sua continuidade.

Por expansão dos eremitas Gracianos, que seguiam a Regra (conjunto de normas de cariz espiritual de comunidades religiosas de frades) de S. Agostinho, doutor da Igreja (homem conceituado nas letras e nos saberes da filosofia e teologia cristãs e de aceitação universal), chegaram a instalar-se, não raras vezes, em pequenos povoados. Sublinha-se a propósito que esta congregação foi canonicamente constituída em 1256 sob os auspícios do papa Alexandre IV, e por volta de 1243 surgem na Península os eremitas Fr. Pascácio e Fr. João Lombardo com orientações superiores de organização de nova província religiosa. Dá-se, em Lisboa, em 1272, a unificação de vários conventos existentes nos reinados de D. Afonso Henriques (conquista de Lisboa 1147) e D. Sancho I, permanecendo como padroeira a sempre Nª Srª da Graça, que por seu intermédio, graças sem fim, concedeu aos nossos primeiros reis em momentos históricos e decisivos nas sua aventuras bélicas, que conduziram à fundação e consolidação da nacionalidade portuguesa.

 

 

Para além de ser entendido como um nobilíssimo título era também assumido como um singular dom a atribuição de denominação de Nª Sª da Graça a qualquer igreja erigida no reino. Não é pois, de estranhar que grandes acontecimentos históricos estejam associados à veneração de Nª Sª da Graça, como sejam os da conquista de Torres Vedras (1367), Santarém (1376), Évora (1380), Montemoro-o-Velho (1494)..., que culminam em construção de igrejas em seu preito e homenagem.

Aqui, na margem esquerda da Ribeira de Vale de Mouro, junto à estrada municipal 591 ( Póvoa/Vale do Seixo), admite-se ter existido um antigo mosteiro no local da Quinta do Passal (que como o nome indica é um terreno pertencente à residência de um pároco ou frade), com provável anexação dos terrenos limítrofes das Quintas do Grilo e do Pisoeiro.

 Apenas no reinado de D. João I (1385-1453), e em resultado das guerras da independência travadas contra os espanhóis, se consumou a separação dos conventos fixados em território português, sob jurisprudência eclesiástica espanhola, passando, “ipso facto” (pelo próprio facto) a obedecer ao priorado geral, constituindo-se em província Graciana independente, em 1477.

Nos termos de um registo paroquial, havia em Póvoa do Concelho, em 1758, 152 fogos e atinge o máximo de população, de que há memória, de mais de 1 000 habitantes, em 1950. Tendo em linha de conta os dados estatísticos do último censos, que teve lugar em 2011, verifica-se um número preocupante de 281 habitantes e de 237 fogos. Constata-se, como é óbvio, uma tendência negativa progressiva de população, resvalando para uma situação de autêntica desertificação, salvo se em sentido oposto e de forma muito séria, nada seja feito numa zona rural do interior como esta, na qual se insere esta freguesia.

 A apresentação do gráfico demonstra, de forma elucidativa, a evolução demográfica de Póvoa do Concelho, sendo reflexo de vários factores, entre eles, __ de enorme impacto __ o fenómeno de emigração, com especial realce, nas décadas de 40, a 70 do século passado, para os continentes da América (Brasil), África (ex-províncias ultramarinas, Angola), privilegiando ainda os países do Velho Continente Europeu (França, Suíça e Alemanha) e, com abrandamento, nas seguintes, voltando, no dealbar do séc. XXI a acentuar-se.

Assinalam-se, assim, as sucessivas vagas de emigrações, com maior ou menor intensidade no séc. XX, cujo comportamento social se repete ciclicamente e, (in) felizmente, até aos dias de hoje. Embora as causas essenciais deste fenómeno sejam comuns a todas as épocas, o facto é que os comportamentos dos intervenientes diferem no que respeita aos emigrantes com destino aos países de acolhimento do continente europeu, mantendo regularmente a ligação com a sua Terra Natal, ao regressar, no verão, em gozo de férias. Talvez, com o sentimento da eterna saudade a impeli-los a conservar, deste modo, uma saudável e quase religiosa visita anual às raízes, aos familiares e amigos. De vez em  quando, regista-se com aplauso a decisão arrojada, de um ou outro emigrante, regressar definitivamente e, sem virar as costas à luta, dedicar-se com afinco a actividades económicas. Para espanto e exemplo de muitos eles estão aí e, coisa rara (nos dias que correm...), com sucesso.

Revela-se ser uma localidade muito laboriosa que, nos seus tempos áureos, tinha uma produção agrícola invejável no que concerne às culturas de cereais, castanha, azeite, batata e vinho. Em complemento, existia também a actividade da pastorícia, que conjuntamente com o gado bovino, constituíam as fontes básicas de receita e de subsistência de outrora, muito embora, nos tempos actuais ainda haja quem se dedique à exploração de gados bovino e ovino.

Não só, mas também as ribeiras, atrás identificadas, __ principalmente na sua confluência __ facilitavam a construção e existência de algumas azenhas e pelo menos a ocupação de 2 moleiros que se dedicavam à moagem, deixando de laborar nos anos de 1954 e 1964, respectivamente. Dos inquéritos paroquiais, consta que já no séc. XVIII existia aqui um moinho.

À actividade normal agrícola e seu crescimento, associa-se a criação do mercado mensal, por acórdão camarário de 13/05/1885, que ocorria no 3º domingo, aproveitando o amplo espaço do “Lugar da Mata”, onde robustos e vetustos castanheiros e oliveiras ofereciam aos feirantes e visitantes a sombra aprazível nos tórridos dias do estio. Surge mais tarde, em data incerta, a alteração do dia do mercado, que por deliberação superior ou determinação dos interesses locais e dos feirantes, passou a realizar-se na 3ª segunda-feira de cada mês. Apraz anotar que o acontecimento trágico do ciclone, em 1941, este belo local, sala de visitas da aldeia, ficou reduzido a pouco mais de meia dúzia dessas árvores heróicas que resistiram à fúria destruidora dessa intempérie. Mais tarde (numa data imprecisa do séc. XX), surgiu uma feira anual de S. António (13/06), que se realizava no lugar do mercado, dando especial realce ao “Encontro” de belos exemplares da raça cavalar, proporcionando aos seus proprietários exibir as suas espécies de estimação, bem como aproveitar transaccioná-las, à época, por bons preços, por vezes, com acertos e desacertos, e barafundas à mistura um tanto ao quanto violentas, sendo algumas dirimidas no tribunal da Comarca de Trancoso. Tanto o mercado como a feira, com maior relevância para aquele do que para esta, contribuíram para o florescimento do comércio da freguesia, resultando daí que, e em conformidade com uma amostra de registos fidedignos de 1917, António Joaquim Balthazar, José Caetano Jorge e Manuel Caetano Jorge Júnior, avantajados agricultores e ilustres conterrâneos, figuravam entre os 40 maiores contribuintes do concelho, fazendo-os integrar no pódio dos mais ricos da região.

Embora não se disponha de uma data exacta da extinção do mercado, tudo leva a crer que tenha acontecido na segunda metade da década de 30 do século passado, com base na memória e relato credíveis de conterrâneos, conhecedores da história da minha/nossa terra. As causas dessa extinção e transferência para a localidade de Vila Franca das Naves (no que respeita ao mercado) poderão ser várias e discutíveis. Contudo, as mais consensuais são aquelas que se prendem com o desenvolvimento da mencionada aldeia (foi elevada à categoria de Vila a 9 de Dezembro de 2004), principalmente o aglomerado populacional situado nas imediações da estação do caminho de ferro, estendendo-se pela avenida principal, onde surgiam lojas de comércio diverso que abasteciam as aldeias vizinhas, bem como o aparecimento, em simultâneo, de negociantes que se dedicavam à compra de produtos agrícolas e que, tirando partido do meio de transporte valioso do caminho de ferro, procediam à venda e escoamento dos mesmos para os grandes centros urbanos.

Mudando de tom, não me levarão a mal os meus amigos e bons vizinhos vilafranquenses em ter a ousadia de os provocar  com o inofensivo enigma: O que é que é, que antes de o ser já o era?!! É tão óbvia a resposta que não precisam que lhes dê a solução, não é verdade?!!

A feira anual, em Póvoa do Concelho, ainda durou mais uns anos, devido ao gosto pelos cavalos que os donos mantinham com tenacidade, vindo acabar mais tarde em data desconhecida. Todavia, é interessante sublinhar o ressurgimento, em 02/09/2006, do primeiro evento equestre ¾ promovido por um grupo de jovens ¾, revelando o gosto antigo por esta espécie de animais e pela arte de bem cavalgar, cuja concentração anual tem por palco o mesmo “Lugar da Mata”. Ali se inicia o “Encontro” equestre e se dá o arranque à programação de eventos de carácter sócio-cultural. Posteriormente, a data deste acontecimento foi alterada para o último domingo de Julho ou o 1º domingo de Agosto, com vista a evitar a coincidência com a  data da festa  anual de S. Sebastião.

Estando atento à toponímia da localidade de Póvoa do Concelho, a sua origem aparece-nos estreitamente ligada à paróquia de Santa Maria de Guimarães de Trancoso, sendo um curato anexo e ainda vir a ser evocada pelo reforço do complemento determinativo “do Concelho” que outro não poderá ser senão o do concelho de Trancoso. Há uma certa inclinação em crer que a referência a “Guimarães” conduz a nome de pessoa (patronímico) de origem germânica, da idade média, designação essa atribuída a uma das quintas que tinham por sede o burgo de Trancoso. Contudo, esta fundamentação parece encontrar-se envolta num ambiente polémico e pouco convincente, daí a   posição mais consensual se focar na etimologia de “Guimarães”. Esta deriva do nome próprio do presor de Porto Calle, Vímara que tomara pelas armas aos invasores o locus Calle no sítio do “Portus” (a passagem da via romana na parte mais estreita do rio Douro), por volta de 868, tendo, para tal, contribuído a acção militar de Afonso III de Leão e das Astúrias (833-912), de cognome o Magno. Culminou assim, esta intervenção militar conjunta, na recuperação de todo o território de que outrora fora destronado por Fruela, seu rival. Nesta refrega belicosa, destaca-se o nobre “milites Vimare Peres”, na qual se pretendeu consolidar, como posição estratégica e administrativa (“Portuscalle”) incluindo os domínios virados a norte e constituindo, por último, os fundamentos reais da futura Terra portucalense.

As sucessivas investidas de povos beligerantes, entre eles, os normandos, obrigaram a que a administração do território fosse transferida para local mais propício à sua defesa e manutenção, pelo que veio a recair em local mais chegado ao interior, dando lugar à criação de Vimaranis (ou seja a terra de Vímara, de seu nome Guimarães), local coincidente àquele que hoje ocupa no mapa geográfico do território.  Mais tarde, as lutas bélicas contra a mourama sucedem-se  num contexto territorial que abrange a disputa dos domínios de Lamego, Viseu e Trancoso. Todos estes vastos territórios foram ocupados por D. Rodrigo e D. Leodegúndia, oriundos do Alto Minho e terras durienses, tendo por filha D. Chama (Flâmula Rodrigues). Esta, fiel à sua honra e deveres de cumprimento do seu testamento doou, em 960, o seu valioso património de terras e bens, nomeadamente ao castelo de Trancoso, entre outros, ao mosteiro de Guimarães, de devoção a Nª. Sª. de Oliveira de Guimarães, cujo nome emblemático (Nª. Sª. de Oliveira de Guimarães) foi atribuído à igreja do castelo reconstruída sobre ruínas.

 É muito mais tarde, em consequência de uma investida de Almansor, com vista a reaver as possessões da beira e vingar-se das derrotas sofridas pelos seus antecessores, que surge novamente o rei de Leão, D. Fernando, de cognome o Magno, (1055) conquistando todos os territórios perdidos, abrangendo toda a região de Trancoso e, como é óbvio, se incluíam os domínios de Póvoa (do Concelho) de Nª. Srª. de Guimarães de Trancoso. Constituíam esses domínios património testamentário a favor do mosteiro Vimarenense, abrangendo as “probaduras” (derivado do latim populaturas), isto é, “pobras” ou póvoas existentes na zona e legadas ao referido mosteiro vindo, por esta via, a acentuar-se uma forte ligação mariânica a Guimarães/Trancoso/Póvoa do Concelho.

 Passando ao período de pacificação, o aglomerado primitivo de Póvoa do Concelho aproveitou a tranquilidade do momento para descer bem lá do alto do Penelo da Vila (castrejo anterior aos primórdios da lusitanidade) e espraiar-se pelos férteis vales e planícies das ribeiras de Vale de Mouro e do Massueime e outras linhas de água de menor relevância, dando lugar à criação de povoamentos e consequente fixação e ocupação territorial das Quintas do Prado, das Queimadas, da Rasa, do Pocinho, do Perlinho, Casal do Pedregal, da Tapada da Laje, dos Trigais, das Moitas, do Rosende, Espadanal, Aldeia Velha e Casal da Atafona. É forte convicção que a Póvoa primitiva tem as suas origens e alicerces ancestrais no alto da cordilheira, a poente, do Pinelo ou Penelo da Vila, que a fiel tradição de gerações das gentes da minha/nossa Terra, chamaram a si, baptizando-a de “Serra da Póvoa”.

Adolescente ou jovem que se preze, certamente aqui veio só ou acompanhado, em romaria ou aventura, em passeio ou estudo, quiçá matar saudades..., e não deixou de aproveitar a ocasião para gozar do privilégio indiscritível daquela ampla e bem arejada varanda da nossa Serra, desfrutando os mais belos horizontes, em dia de sol radioso primaveril e, simultaneamente, ali se inspirar nas origens profundas dos seus mais remotos antepassados. Daqui, em cima deste palco maravilhoso, pode soltar uma saudação altiva à Vila (agora cidade) e ao seu castelo amuralhado (distância aproximada de­­ 6 km em linha recta), com voz estridente de pregoeiro, o belo poema da autoria de Manuel Joaquim Barroco:

“Tarracon, rei de Etiópia e Egipto

Dizem ser seu fundador,

Mas isso não passa de mito

Pois não há provas de valor.

Prosperaste nos tempos dos godos,

Depois os árabes te habitaram,

E as tropas de Fernando Magno,

Dos mouros te libertaram.

O rei mouro, Albrecazan voltou

Em ódio guerreiro  e feroz,

De ferro e fogo te matou

Fugindo depois para Badajoz.

A rainha Santa Isabel

Tinha Trancoso no pensamento

Por na igreja de S. Bartolomeu,

Ter contraído seu casamento

Terra do famoso profeta

O Bandarra, sapateiro

Cujas enigmáticas profecias

Correu Portugal inteiro”.

Afinal que marcas visíveis deixaram os vários povos que por aqui passaram? Para além do que atrás já fora mencionado, encontraram-se, no período da década de sessenta do século passado, na Quinta do Prado (exploração agrícola do sr. José Antunes Guiomar), vários achados arqueológicos a atestar a presença de povos de influência romana. Entre essas descobertas apareceram tijolos, telhas (uma delas com uma inscrição) e pesos de tear, que actualmente se encontram em exposição no museu municipal da Guarda, expressando ainda o nosso prezado conterrâneo a vontade e alegria de todo o citado espólio o poder ver regressar um dia ao futuro museu, a criar, na nossa terra. Não muito distante dali, cerca de 2,5 Km (?) vai-se encontrar a ponte romana dos “Carvalhais”, robusta de três arcos sobre a ribeira do Massueime, relativamente bem conservada, que no dizer dos estudiosos servia de passagem aos exércitos romanos em direcção a Bracara Augusta (Braga).

Na povoação são raros os vestígios visíveis, mas a presença destes, como por exemplo a coluna de granito, na rua da Cruz de Pedra, ligeiramente facetada na extremidade ao alto, enquadra-se na simbologia fálica romana e que alguém, intencionalmente ou não, cristanizou aquele símbolo pagão colocando no seu topo a cruz de Cristo. A uns escassos metros daqui, em sentido oposto, existia uma habitação que foi demolida, da qual foram removidas algumas pedras e recolhidas, representando imagens de animais julgando serem de origem romana. Dir-se-á ainda que o vocábulo “atafona” atribuído ao Casal da “Atafona” (propriedade rústica) provém do árabe at-tahiina, local de moinho, e, por coincidência ou não, sabe-se lá..., ainda existe hoje nas imediações a Quinta do Moleiro. É curioso não é?!! E quanto ao resto? Tudo o tempo levou e os homens também consentiram devido à ignorância e inércia...

Quanto a ilustres personalidades históricas de Póvoa do Concelho, destacaria, nos meados do  séc. XVII, a título de exemplo, o cavaleiro Francisco de Sequeira, fidalgo de renome de quem se diz ser natural e aqui provavelmente ter morado, após a sua missão bélica e valorosa em Tânger, da qual resultou a monarquia ter-lhe concedido a apreciada quantia de 2 000 réis pelos serviços prestados. Outros haveria a assinalar, mas não será por isso que merecem menor respeito e deixarão de ombrear com os maiores seus antepassados.

Após esta viagem e chegados aqui, passeando sobre os fundamentos, memória e origens, isto é, a história da minha, da tua, nossa Terra beirã e trancosana, não poderia deixar de vos dirigir o derradeiro convite: vinde e confirmai que a Terra de todos nós nasceu ao colo de Nª. Senhora a cheia de Graça na companhia do Menino-Deus, merecendo a dócil Mãe o nosso duplo compromisso de fidelidade de amor filial e ainda a veneração e devoção profundas à sua imagem colocada, em sentinela, no altor-mor da igreja matriz de Póvoa do Concelho. Salvé, ó Padroeira.

José Condesso

BIBLIOGRAFIA

-- Almanaques Anuários de Trancoso “O BANDARRA” de Santos  Costa;

-- Almanach-Annuários de Trancozo de H. Bravo

-- Livro “Panoramas do Distrito da Guarda” de Manuel Joaquim Barroco;

-- “Jornal A Guarda”;

-- Colaboração de amigos conterrâneos e outras pessoas de estima.
 
Obrigado Professor José Condesso pelo excelente trabalho, que dignificou em muito o nosso Jornal Paroquial. A pesquisa fruto de muito trabalho ficará exposta aqui no nosso Blogue.
Maria Clara Correia

 

 

Sem comentários:

Enviar um comentário